NelsonGalvao,
[1] https://www.theguardian.com/news/datablog/2013/may/24/missing-statistics-pornography
O cristão e a pornografia, por pr. Nelson Galvão
O sinal para o intervalo tocou. Descemos como
de costume para o pátio da escola. Mas, dessa vez algo estava diferente. Havia
um conglomerado de rapazes no centro da quadra. Estavam todos organizados em uma
roda com o foco no centro. Pensei que seria uma briga, mas davam risadas e
faziam gestos e gracejos obscenos. Então, logo descobri do que se tratava,
algum dos rapazes pegou a revista pornográfica do pai e trouxe para a escola.
Foi o “evento” do dia!!!
Hoje com a tecnologia não existe mais esse tipo
de “evento”. Isso porque não é mais novidade. A tecnologia facilitou o acesso à
pornografia. Estar diante de imagens imorais é tão fácil quanto dar um click!
Nos últimos anos a pornografia cresceu tanto
que se tornou uma das marcas sociais mais preponderantes. De acordo com reportagem
do jornal britânico The Guardian, existe uma grande dificuldade de dados
estatísticos em relação à pornografia. Entretanto, sabe-se que está por toda a
parte. Segundo relatório existe proporção significativa de crianças e jovens que
são expostos ou acessam a pornografia[1].
Agora, é um grande equívoco achar que os
cristãos estão imunes a este mal. Não, existem inúmeros jovens e adultos,
homens e mulheres, solteiros e casados dentro das igrejas que lutam silenciosamente
contra este pecado. Esses cristãos sabem que a prática de perversões sexuais como
a pornografia é errada. Entretanto, a despeito de seu conhecimento, ainda se
deixam intoxicar.
Os efeitos nocivos dessa prática pecaminosa são
inúmeros, dentre os quais destaco: degradação da mulher; degradação do sexo tal
qual como criado por Deus; destruição do casamento e das relações entre pais e
filhos. Sim, existe nas igrejas uma luta silenciosa contra a pornografia e
muita gente tem perdido essa luta. Por isso, inúmeros casamentos naufragando, jovens
com namoros promíscuos e que não conseguem crescer na caminhada cristã.
Diante disso, como lutar? Que armas temos à
nossa disposição para lutar contra tamanha ameaça? A Palavra de Deus oferece
auxílio para aqueles que lutam contra a pornografia e constitui-se na poderosa e
efetiva arma de desintoxicação. Vejamos então como a Palavra de Deus nos
orienta em relação a isso.
Reconheça
que é pecado
O desejo sexual por si só não é pecado. Ao
contrário, é uma dádiva graciosa de Deus. Entretanto, ele foi corrompido pelo
pecado e, se não transformado pela graça de Cristo é uma poderosa ferramenta de
degradação. Comentando sobre isso, Timothy Keller afirma:
“O propósito do sexo é entregar-se por inteiro
para a vida toda. O coração pecaminoso, contudo, deseja usar o sexo por razões
egoístas, e não para expressar uma entrega total”[2].
É por isso que Paulo escrevendo aos Romanos
exorta:
“Comportemo-nos com decência, como quem age à
luz do dia, não em orgias e bebedeiras, não em imoralidade sexual e depravação,
não em desavença e inveja.
Pelo contrário, revistam-se do Senhor Jesus
Cristo, e não fiquem premeditando como satisfazer os desejos da carne” (Rm
13.13,14).
Perceba
que nesse texto Paulo adverte a respeito da “imoralidade sexual” e da “depravação”.
A imoralidade sexual é o sexo ilícito, aquele fora dos parâmetros dados pelo
Criador. A depravação, por sua vez, é a cobiça sem controle. Envolve a
imoralidade sexual, o sexo ilícito, mas com a adição da insaciabilidade. Note
aqui os elementos da pornografia: sexo ilícito e insaciabilidade.
Em
outras ocasiões, Paulo menciona uma palavra grega: πορνεια (porneia). O curioso é que essa palavra é a mesma que foi
transliterada para o português “pornografia”. Entretanto, o sentido em Paulo é
mais amplo. Trata-se de toda e qualquer relação sexual imoral, incluindo a
pornografia.
Assim, em Romanos,
Paulo diz que o resultado da rebeldia contra o Criador é que os homens
tornam-se: “cheios de toda injustiça, malícia (πορνεια), avareza e maldade; possuídos de inveja, homicídio, contenda, dolo e
malignidade; sendo difamadores” (Rm 1.29). Alistando as obras
da carne, Paulo menciona: ”prostituição, impureza (πορνεια), lascívia”
(Gl 5.19). Escrevendo aos Coríntios, Paulo adverte a respeito de uma disposição
de coração que gera pecados semelhantes ao povo de Israel no deserto. Um desses
pecados é a πορνευωμεν (porneuomem), imoralidade:
“E não pratiquemos imoralidade, como alguns deles o
fizeram, e caíram, num só dia, vinte e três mil” (1 Co 10.8). Aos Efésios, Paulo diz
que “entre vocês não deve haver nem sequer menção de
imoralidade sexual
(πορνεια) nem de qualquer espécie de impureza nem de cobiça; pois estas coisas
não são próprias para os santos” (Ef 5.3).
Sim, a pornografia é pecado e, como tal,
rebeldia contra Deus. Dessa forma, antes de mais nada, é preciso o
reconhecimento de que a pornografia é pecado. Existem aqueles que minimizam a
questão e afirmam: “Não tem problema”, “de tantos males vamos nos preocupar com
algo tão bobo?!”.
Bem, a despeito disso, precisamos reconhecer
que a pornografia é rebeldia contra o Criador e gradativamente viciante.
Seu
prazer deve estar em Cristo
Nós abraçamos todo e qualquer pecado porque
acreditamos na mentira de que ele nos fará felizes. Acreditamos em sua promessa
de que ele nos trará satisfação. Timothy Keller comenta sobre isso da seguinte
forma:
“Uma das razões pelas quais ardemos de paixão
sexualmente aparentemente incontrolável é que, no momento, nosso coração crê na
mentira de que, se tivermos uma experiência romântica e sexual extraordinária,
finalmente nos sentiremos profundamente satisfeitos”[3].
Entretanto, veja o que Jesus disse em João
6.35:
Declarou-lhes, pois, Jesus: Eu sou o pão da vida; o
que vem a mim jamais terá fome; e o que crê em mim jamais terá sede.
O princípio aqui é: somente Cristo nos traz a
verdadeira satisfação. Uma vez que realmente estamos satisfeitos nEle, não
cederemos as tentações do pecado. Comentando sobre isso, John Piper afirma: “O
combate da fé contra a luxúria é a luta para ficar satisfeito com Deus”[4].
Pense bem, uma vez que você acabou de comer
aquele churrasco, você não vai sair à procura daquele sanduíche malfadado da
esquina!
Como pastor de jovens tenho conversado com
alguns jovens e adolescentes que lutam contra a pornografia. Alguns deles
afirmam que sabem que é errado, mas não conseguem deixar. A grande questão não
é o prazer que temos com o pecado. Se o pecado não desse prazer não
pecaríamos!!! A grande questão é o quanto estamos satisfeitos em Cristo.
Sendo assim, você que luta com um filho
envolvido em pornografia, você precisa focar não tanto no comportamento dele,
mas naquilo para o qual esse comportamento aponta: o coração. Considere uma
oportunidade para levar seu filho mais uma vez para os pés da cruz.
Saiba os
benefícios do sexo nos termos de Deus
Em Desintoxicação
Sexual, Tim Challies[5] trata sobre a temática da
sexualidade, especificamente a prática da pornografia. De acordo com o autor, o
enfrentamento da pornografia deve levar em consideração não somente que esta
prática é errada, mas também os benefícios do sexo dentro dos propósitos de
Deus para ele.
Perceba que depois que Deus criou todas as
coisas, o homem e a mulher (inclusive o sexo), “viu que tudo era muito bom!”
(Gn 1.31). Sim, o sexo dentro dos termos dados por Deus é bom e traz benefícios
para os parceiros. No cap. 2 de Genesis está o relato mais detalhado da criação
da mulher. Depois que Deus cria a mulher e, tal pai da noiva, traz a mulher ao
homem, este reage com uma poesia: “Esta, afinal, é
osso dos meus ossos e carne da minha carne; chamar-se-á varoa, porquanto do
varão foi tomada”
(Gn 2.23).
O sexo dentro dos termos de Deus traz inúmeros benefícios,
dentre eles está a alegria sem culpa.
O pecado de Adão (Gn 3) começou com a descrença
na Palavra de Deus (Gn 2.16,17), em não crer que esta era a orientação correta
que lhes traria plenitude. Adão e Eva não se satisfizeram com a orientação de
Deus, escolheram algo mais.
Reconheça
sua fraqueza
Paulo chama a imoralidade de obra da carne (Gl
5.19). É curioso que em poucos versos antes, ele afirma que existe uma forma de
não satisfazermos os desejos da carne: “Andai no Espírito” (Gl 5.16).
O que significa andar no Espírito? Não, não é
ter revelações, visões, dar piruetas espirituais, falar em línguas ou qualquer
coisa do tipo. O Texto responde. Basta ler o contexto!
Paulo
escreve aos Gálatas que estavam cedendo à influência de falsos
mestres na igreja que ensinavam um “outro evangelho” (Gl 1.6-9).
A indignação de Paulo se dava pelo fato dos
Gálatas estarem absorvendo as doutrinas desses falsos mestres.
Esse “outro evangelho” ensinado pelos falsos
mestres de Gálatas tinha como característica principal a confiança nas obras da lei como caminho para a justificação.
Contra essa heresia, Paulo argumenta (Cap. 3)
que os Gálatas receberam o Espírito pela fé (Gl 3.2); ou seja, foi por meio da
obra do Espírito Santo que vieram a crer em Jesus Cristo e foram salvos.
Entretanto, embora tivessem “começado pelo Espírito”, agora estavam “se aperfeiçoando
pela carne” (Gl 3.3). Eles começaram crendo unicamente em Cristo para a
salvação, mas agora, estavam crendo que a santificação se dava pelas obras da
Lei.
No cap 5, Paulo volta a esse tema e diz que
assim como eles começaram no Espírito, deveriam andar no Espírito (Gl 5.25).
Logo, o andar no Espírito (Gl 5.16) é confiar no sacrifício de Cristo para a
santificação, assim como confiamos para a salvação.
Essa confiança em Cristo implica em
desconfiança em nossa própria capacidade. Dessa forma, na luta contra a
pornografia, devemos desconfiar de nossa capacidade de vencer. Todas as vezes
que nos sentimos fortes o suficiente para dizer não ao pecado, ele vem e nos
humilha, nos mostrando quem realmente somos! Então, não é a nossa capacidade,
mas a força e o mérito do Nosso Senhor.
Revista-se
Paulo usa uma figura muito curiosa, o despir-se
e revestir-se. Aos Efésios, ele diz:
Mas não foi assim que aprendestes a Cristo, se
é que, de fato, o tendes ouvido e nele fostes instruídos, segundo é a verdade
em Jesus, no sentido de que, quanto ao trato passado, vos despojeis do velho
homem, que se corrompe segundo as concupiscências do engano (Ef 4.21,22).
Ao mesmo tempo, os Efésios deveriam:
e vos renoveis no espírito do vosso
entendimento, e vos revistais do novo homem, criado segundo Deus, em justiça e
retidão procedentes da verdade (Ef 4.23,24).
De forma semelhante, os Colossenses não
deveriam mentir uns aos outros, “uma vez
que vos despistes do velho homem com os seus feitos e vos revestistes do novo
homem que se refaz para o pleno conhecimento, segundo a imagem daquele que o
criou” (Cl 3.9,10).
Agora, como revestir-se? Enchendo-se do
Espírito (Ef 5.18). E como encher-se do Espirito? O Texto continua:
falando entre vós com salmos, entoando e
louvando de coração ao Senhor com hinos e cânticos espirituais, dando sempre
graças por tudo a nosso Deus e Pai, em nome de nosso Senhor Jesus Cristo, sujeitando-vos
uns aos outros no temor de Cristo.
Não é possível vencer a pornografia quando
nossa mente é diariamente bombardeada pela sensualidade oriunda da TV, revista,
sites, redes sociais e músicas. Nossa mente precisa ser inundada da Palavra de
Deus. Então, pergunto: como tem sido seu tempo com a Palavra de Deus? Você tem
lido livros que o confrontem com o Evangelho de Cristo? Você tem escutado música,
assistido pregações no youtube, conversado com cristãos bíblicos que te ajudem
no crescimento no conhecimento da Palavra de Deus?
Fuja
Existem inúmeros imperativos no Novo Testamento.
São ordens de como os filhos do Rei devem proceder nesse mundo. Então, somos
ordenados a resistir ao diabo (Tg 4.18); a não dar lugar ao diabo (Ef 4.27); travar
o bom combate, conservando a fé e a boa consciência (1 Tm 1.18,19), etc.
Entretanto, é curioso que quando se trata da imoralidade
sexual, a Bíblia usa termos diferentes. Como já vimos acima, Paulo menciona a πορνεια, ao escrever para os Coríntios (1Co 10.8). Agora, é curiosa a exortação de Paulo:
Fugi da impureza (πορνεια). Qualquer outro pecado que uma pessoa cometer é fora do corpo; mas
aquele que pratica a imoralidade peca contra o próprio
corpo. (1 Co 6.18).
Fugi! Essa é a orientação aos Coríntios. A
mesma palavra é usada em Mt 10.23, quando Jesus adverte sobre as perseguições
que viriam sobre seus discípulos:
Quando, porém, vos perseguirem numa cidade, fugi para
outra; porque em verdade vos digo que não acabareis de percorrer as cidades de
Israel, até que venha o Filho do Homem (Mt
10.23).
A ideia é de escapar. Então, Paulo está
dizendo: “Fujam da imoralidade sexual”.
Na prática significa escaparmos de situações
que alimentam o pecado. Então, evite:
ü ficar sozinho no
computador no quarto, especialmente até tarde da noite;
ü celular na cama na hora
de dormir;
ü programas de TV e filmes
com cenas impróprias.
Atenção! Perceba que isso não se refere a
regras mecânicas de apenas “não faça isso, ou não faça aquilo”. Concordo com
Paul Tripp quando ele alerta que “a maioria dos pais dos adolescentes tenha
como objetivo mais básico controlar o comportamento de seus filhos”[6]. Esse pais esquecem que a
grande questão não é comportamento, mas o coração.
Refiro-me a um princípio e sua aplicação em
nosso cotidiano. Assim, apenas sugeri algumas coisas como exemplo para você
pensar. Você mesmo sabe em que circunstâncias é mais tentado e como deveria
fugir dessas coisas.
Procure
ajuda
Uma das coisas mais incríveis do cristianismo é
a coletividade. O Novo Testamento quando menciona a Igreja, sempre denota
coletividade. As figuras usadas remontam à coletividade, como: corpo, edifício,
templo, família, povo.
Por que então deveríamos lutar contra o pecado
sozinhos? Precisamos nos valer da bênção de ser igreja. Assim, Tiago orienta: “Confessai,
pois, os vossos pecados
uns aos outros e orai uns pelos outros, para serdes curados. Muito pode, por
sua eficácia, a súplica do justo” (Tg 5.16).
Diante de uma cultura permissiva e
pornográfica, a confissão de nossos pecados aos nossos irmãos se torna uma
ferramenta valiosa de luta contra os efeitos atraentes e nocivos da pornografia.
Então, não lute sozinho. Procure um conselheiro
bíblico, alguém maduro na fé cristã que irá te ajudar no combate a este mal.
Pr. Nelson Galvão
Sola Scriptura
[2]
Timothy Keller. O significado do casamento. p. 267.
[3]
Timothy Keller. O significado do casamento. p. 276.
[4]
John Piper. Lutando contra a incredulidade. p. 148
[5] Tim
Challies. Desintoxicação sexual: um guia para homens que querem fugir da imoralidade
sexual.
São Paulo: Vida Nova, 2011
[6]
Paul David Tripp. A Idade da oportunidade. p. 113
Nelson é casado com Simone desde 1997 e eles têm um filho. Ele é formado em História e Teologia, pós-graduado em Administração Escolar e mestre em Educação (PUC-SP). Atualmente faz mestrado em Teologia do Novo Testamento no Seminário Bíblico Palavra da Vida- Atibaia, SP.
É pastor interino da Igreja Batista Sião (São José dos Campos-SP) e atua como diretor acadêmico do ministério Pregue a Palavra.
Atua ainda como coordenador do grupo do Pregue a Palavra de Cuba e como professor convidado da Escola de Pastores PIBA.
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