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Sobre a adoção. Parte 3. Adoção como privilégio . por Bianca Bonassi Ribeiro

agosto 02, 2018 Mulher da Palavra 0 Comments




A segunda etapa deste estudo apresentou a adoção como propósito. Estudamos que Deus usou a adoção de Moisés, pela filha do faraó, para poupá-lo da morte e treiná-lo para uma grande missão – liderar e conduzir os israelitas no deserto. Nesta terceira parte, veremos que a adoção é um privilégio para os adotantes. A Palavra de Deus apresenta José, o pai terreno de Jesus, como um dos privilegiados e como Deus permitiu que ele fizesse parte de uma história de um Reino eterno.
Na maioria das vezes, quando uma pessoa se depara com uma história de adoção, ela exclama: que privilégio dessa(s) criança(s)! Particularmente já ouvimos isso diversas vezes. As pessoas comentam sobre as muitas oportunidades que essa criança passou a ter. Mas, quando Luciano e eu ouvíamos isso, logo pensávamos: o privilégio é nosso. Isso porque temos a oportunidade de entender e aprender muitas coisas. Assim, este capítulo se concentra no privilégio do adotante e não do adotado, especialmente como ilustração de verdades espirituais.
No Brasil, o adotante pode estabelecer uma lista de critérios para escolher a criança almejada. Os requisitos vão desde a faixa etária da criança, passa por cor de pele, tipo de cabelos, sexo, estado de saúde e muitas outras características que condicionam a escolha. Obviamente, quanto maior e mais específica esta lista, mais tempo de espera para o adotante. Muitos adotantes procuram semelhanças físicas entre eles e o adotado. No entanto, acredito que esse não deve ser o foco. Isso porque o privilégio do adotante está na escolha de amar alguém que não vai se parecer fisicamente com ele. A ênfase está na liberalidade de escolher amar o outro. O amor é uma ação que envolve disposição de coração, independentemente de como se apresenta o ser amado.
Em uma relação de adoção, o adotante conta ainda com o privilégio de ensinar os seus valores, a sua forma de viver e ver o mundo, os seus gostos e hábitos para o adotado. O adotante terá quem receba a sua herança e não me refiro apenas aos bens. Ele terá quem continue o seu legado, a permanência da sua genealogia da mesma forma que um casal cujos filhos são biológicos. Todos esses privilégios podem partir de um foco egoísta, mas acredito que na maioria das vezes ele está carregado de um sentimento altruísta. Na Bíblia, um grande exemplo desse tipo de amor está representado na relação de paternidade (por adoção) entre José e Jesus.
Apenas para contextualizar, vale lembrar que centenas de anos se passaram depois da libertação do povo de Israel (descentes de Jacó) sob a liderança de Moisés. Esse povo se tornou uma nação e em certo momento da história passou a ser governado por reis. Deus escolheu a linhagem de Davi (um rei segundo o coração de Deus – At 13.22) para perpetuar um reinado. Porém, os israelitas se rebelaram contra Deus e foram subjugados por outros impérios, por isso na época em que Jesus nasceu, a nação de Israel estava debaixo da autoridade do Império Romano.
A encarnação do próprio Deus ocorreu de forma sobrenatural e foi previamente anunciada pelo profeta Isaías 7.14 “Por isso o Senhor mesmo dará a vocês um sinal: a virgem ficará grávida, dará à luz um filho e o chamará Emanuel”. Depois de anos, a profecia se realizou como descrito em Mateus 1.18-25:
Foi assim o nascimento de Jesus Cristo: Maria, sua mãe, estava prometida em casamento a José, mas antes que se unissem, achou-se grávida pelo Espírito Santo. Por ser José, seu marido, um homem justo, e não querendo expô-la à desonra  pública, pretendia anular o casamento secretamente. Mas, depois de ter pensado nisso, apareceu-lhe um anjo do Senhor em sonho e disse: “José, filho de Davi, não tema receber Maria como sua esposa, pois o que nela foi gerado procede do Espírito Santo. Ela dará à luz um filho, e você deverá  dar-lhe o nome de Jesus, porque ele salvará o seu povo dos seus pecados.” Tudo isso aconteceu para que se cumprisse o que o Senhor dissera pelo profeta: “A virgem ficará grávida e dará à luz um filho, e o chamarão Emanuel, que significa “Deus conosco”. Ao acordar, José fez o que o anjo do Senhor lhe tinha ordenado e recebeu Maria como sua esposa. Mas não teve relações com ela enquanto ela não deu à luz um filho. E ele lhe pôs o nome de Jesus (grifo meu)
Notamos que o anjo do Senhor saudou José como filho de Davi (Mt 1.20; Lc 1.27 e 2.4-5), esse tipo de saudação seria como, atualmente, cumprimentar uma pessoa por seu nome e sobrenome. O cuidado do anjo, bem como o de Mateus e Lucas em ressaltar José como filho de Davi é importante porque identifica sua origem legal e social.
Mateus, inclusive, inseriu José como sucessor legal ao trono de Davi a partir de um direito adquirido por herança e comprovado pela genealogia de Jesus (filho adotivo de José), de acordo com a figura abaixo. 

Genealogia de Jesus

Jacó gerou Judá e seus irmãos;

Judá gerou, de Tamar, Farés e Zará;
Farés gerou Esrom;
Esrom gerou Arão;
Arão gerou Aminadabe;
Aminadabe gerou Nasom;
Nasom gerou Salmom;
Salmom gerou, de Raabe, Boaz;
Boaz gerou, de Rute, Obede;
Obede gerou Jessé;
Jessé gerou o rei Davi.
Davi gerou, daquela que havia sido mulher de Urias, Salomão;
Salomão gerou Roboão;
Roboão gerou Abias;
Abias gerou Asa;*
Asa* gerou Josafá;
Josafá gerou Jorão;
Jorão gerou Ozias;
Ozias gerou Jotão;
Jotão gerou Acaz;
Acaz gerou Ezequias;
Ezequias gerou Manassés;
Manassés gerou Amom;
Amom gerou Josias;
Josias gerou Jeconias e seus irmãos, na época do exílio na Babilônia.
Depois do exílio na Babilônia, Jeconias gerou Salatiel;
Salatiel gerou Zorobabel;
Zorobabel gerou Abiúde;
Abiúde gerou Eliaquim;
Eliaquim gerou Azor;
Azor gerou Sadoque;
Sadoque gerou Aquim;
Aquim gerou Eliúde;
Eliúde gerou Eleazar;
Eleazar gerou Matã;
Matã gerou Jacó;
Jacó gerou José, marido de Maria, da qual nasceu Jesus, chamado Cristo.


Fonte: figura construída a partir de Mateus 1. 1-16.

Ao descrever a genealogia de Jesus, Mateus apresentou a sequência de sucessores ao trono de Davi, por direito. Porém, naquela época (em torno de 5-4 a.C) o território da Judéia (parte de Israel que coube aos descendentes de Davi reinar) estava sob o domínio do Império Romano e Herodes o Grande, filho de Antípater[1] foi designado rei desse território. Ele conquistou esse cargo em virtude de sua fidelidade à Roma, que estava sob o comando de Júlio César, o imperador.
Por essa razão, José (marido de Maria e pai de Jesus), embora tivesse o direito ao trono, em virtude do contexto político da época não pode reinar. Nas sociedades organizadas em torno do parentesco (caso de Israel/Judá) as genealogias eram documentos históricos que estabeleciam a identidade e também legitimavam cargos.
De acordo com Youngblood, Bruce e Harrison (2004)[2] a estrutura social apresentada no Antigo Testamento é conhecida como patriarcal, ou seja, governada pelo pai, logo, a partir do costume judaico, ele tinha quatro grandes responsabilidades: a) circuncidar o filho, b) passar sua herança ao filho primogênito, c) encontrar uma esposa para o filho e, d) ensinar ao filho uma profissão. José e toda a sociedade israelita/judaica estava sob essa estrutura patriarcal e José cumpriu três de suas responsabilidades.
A  Palavra de Deus revela que foi José que deu o nome do menino Jesus (Mt 1.25b), exatamente como o anjo ordenara. O processo de nomeação seguiu a tradição da sociedade de Israel/ Judá conforme apresentado por Lucas 2.21-23:
Completando-se os oito dias para a circuncisão do menino, foi-lhe posto o nome de Jesus, o qual lhe tinha sido dado pelo anjo antes de ele nascer. Completando-se o tempo da purificação deles, de acordo com a Lei de Moisés, José e Maria o levaram a Jerusalém para apresenta-lo ao Senhor (como está escrito na Lei do Senhor: “Todo primogênito do sexo masculino será consagrado ao Senhor” – grifo meu).
A primeira responsabilidade de um pai, no contexto sociocultural da época foi cumprida por José, ele não só deu o nome ao filho de Maria, como também assumiu a responsabilidade de pai. O ritual de circuncidar e dar o nome equivalia ao que hoje denominamos registro em cartório de filiação e nascimento de um filho. Assim como, o registro e obtenção da certidão de nascimento de uma criança o vincula legal e socialmente a um núcleo familiar, a circuncisão e oferta no templo, legitimava o parentesco da criança àquela família.
Para muitos pais biológicos o registro de nascimento e filiação realizado no cartório é algo tão simples e comum que não exige grandes comemorações. No entanto, este ato para pais adotivos é a consumação e segurança de que finalmente aquela criança tão amada, legalmente pertence à família. No Brasil, os adotantes esperam meses para conseguir registrar seus filhos, porque pela lei, nós precisamos aguardar um período onde temos a guarda provisória da criança. Enquanto a adoção não se legitima no cartório, mesmo que ela esteja sob nossos cuidados, nós ainda não temos plenos direitos sobre ela. Por isso, quando a adoção é legitimada em cartório os adotantes ficam muito felizes e aliviados.
Quando José legitimou a paternidade dele para com o bebê Jesus, filho de Maria, o vínculo adotivo estabeleceu os direitos e deveres de cada um nessa relação. Portanto, o fato de José ter direito ao trono (linhagem real de Davi) e Jesus ser o filho primogênito do sexo masculino, Ele herdou o direito terreno de se tornar Rei. Importante ressaltar que o desfrute dessa herança na Terra, ainda não foi exercido por Jesus. Isso não quer dizer que Ele não seja Rei no plano celestial, mas dentro da estrutura lógica que rege os seres humanos, Jesus em tempos futuros desfrutará de seu direito ao trono Davídico.
O reino de Jesus, na Terra, acontecerá depois de sua segunda vinda. Isso porque a primeira vinda D’Ele focou em viver como ser humano e não como Rei. Por isso nasceu e foi adotado por José, viveu como exemplo e com sua morte e ressurreição oferece salvação a todos quanto O aceitarem como Senhor e Salvador, conforme previamente anunciado.  
Resumindo, a influência de José como pai fiel a Deus foi retratada como um exemplo de líder paterno. Ao receber um comando divino ele obedeceu, independentemente do que as pessoas ao redor pensariam. José:
a)     quando alertado a não deixar Maria e assumir o filho que biologicamente não era seu, ele obedeceu (Mt 1.20);
b)     levou o menino para ser circuncidado no templo em Jerusalém (Lc 2.21-23);
c)      atendeu ao alerta, dado por um anjo e fugiu para o Egito com Maria e Jesus ainda bebê, a fim de salvá-lo da ira de Herodes (Mt 2.13-14);
d)     retornou para Israel com Maria e Jesus, depois do comando de um anjo, após a morte de Herodes (Mt 2.19-23);
e)     levou sua família, anualmente, na época da Páscoa para Jerusalém por ocasião das festividades religiosas;
f)       ensinou uma profissão a seu filho Jesus, a carpintaria (Mc 6.3).
Por fim, José não pôde escolher uma esposa para Jesus, o item c das quatro grandes responsabilidade de um pai israelita/judeu, mas isso ocorreu porque a noiva de Cristo não é humana, ela é representada pela Igreja de Cristo e o casamento ainda está para acontecer. Essa noiva foi escolhida por Deus Pai e não pelo pai José.  Mas, o privilégio de José, o adotante, recai na condição de que Deus escolheu um homem mortal para fazer parte de um plano e reino celestial e eterno.
Assim, a condição privilegiada de pais adotivos está na possibilidade de experimentar graciosamente a vivência de como é possível amar tão profundamente outra pessoa, mesmo que biologicamente não haja ligação. Dessa forma, o filho que não possui a essência genética dos pais, ao longo do tempo se parece com eles no que se refere a gostos, hábitos, valores e forma de agir. Trata-se de um exemplo simbólico, mesmo que imperfeito e muito superficial, de como o Pai Celestial ama e transforma seus filhos adotivos, ou seja, todos os que já aceitaram a Jesus como único Salvador.

“Os filhos são herança do Senhor, uma recompensa que ele dá”
(Sl 127.3 – grifo meu)



[1] Homem considerado não israelita/ judeu por pertencer à linhagem de Esaú que era irmão gêmeo de Jacó (Israel) ambos filhos de Isaque e Rebeca e por não ser da linhagem de Davi não poderia reinar sobre o povo israelita.
[2] Dicionário Ilustrado da Bíblia. Editor Geral: Ronald F. Youngblood; co-editores: F.F. Bruce & R.K. Harrison. São Paulo: Vida Nova, 2004, p. 548 e 1030.

Bianca Bonassi Ribeiro


[1] Homem considerado não israelita/ judeu por pertencer à linhagem de Esaú que era irmão gêmeo de Jacó (Israel) ambos filhos de Isaque e Rebeca e por não ser da linhagem de Davi não poderia reinar sobre o povo israelita.
[2] Dicionário Ilustrado da Bíblia. Editor Geral: Ronald F. Youngblood; co-editores: F.F. Bruce & R.K. Harrison. São Paulo: Vida Nova, 2004, p. 548 e 1030.



Confira também as publicações anteriores da série sobre adoção:




Bianca é casada com Luciano. Eles têm dois filhos, o Pedro e o Vitor. Ela faz parte da equipe docente da Universidade Presbiteriana Mackenzie-SP, desde 2007 e é membro da Primeira Igreja Batista de Atibaia.
Bianca é doutora em Comunicação e Semiótica, mestre em Administração e graduada em Administração de Empresas.

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