Livros
Nenhuma imagem de escultura, por Timothy Keller
Como, então,
podemos glorificar a Deus em meio ao sofrimento e como o sofrimento pode nos
ajudar a glorificar a Deus?
Em 1966,
Elizabeth Elliot, que foi missionária entre os waorani nas florestas do
Equador, escreveu um romance intitulado “ Nenhuma imagem de escultura”. O livro
conta a história de uma jovem chamada Margareth, que dedicou a vida à tradução da
Bíblia para tribos isoladas da civilização cuja linguagem era apenas oral.
A moça foi
traduzir a Bíblia para os povos quíchua que habitavam nas montanhas do Equador.
Margareth conheceu Pedro, um senhor de importância vital para seu trabalho
porque conhecia o dialeto oral necessário à tradução da Bìblia na língua desse
povo[...]
Certo dia, a caminho de se encontrar com Pedro, Margaret sentiu uma
enorme gratidão envolver sua alma. Ela se lembrou do versículo” Espera pelo
Senhor; anima-te e fortalece o teu coração ( Sl 27.14), Ela então orou a Deus:”
Estou esperando, esperando, esperando, Senhor... Tu sabes quanto esperei para
ser missionaria entre os nativos das montanhas.... Então tu enviaste o Pedro...
estar aqui já é uma resposta de oração. “
A jovem pensa
em tudo o que foi necessário para ela estar ali naquele dia: o apoio de amigos,
a ajuda financeira da igreja, anos de estudo e desenvolvimento de amizades, e
claro, a provisão de uma pessoa que conhecia tanto o espanhol quanto o dialeto
necessário ao seu trabalho. Agora, parecia que Deus estava juntando as peças.
Margaret imaginou a possibilidade de levar a Bíblia a um milhão de pessoas nas
regiões longínquas das montanhas.
Ao chegar à
casa de Pedro, ela descobre que ele está com uma ferida dolorosa e infeccionada
na perda. Como parte de seu trabalho era oferecer cuidados médicos básicos,
Margaret trazia consigo uma seringa e algumas ampolas de penicilina. Pedro pede
que ela lhe dê uma injeção, e Margaret concorda. Contudo em segundos,
Pedro tem um choque anafilático, uma reação alérgica. Aos prantos, a família se
reúne ao redor do homem, que entra em convulsão. “ Você não vê que
ele está morrendo?”, Rosa a esposa, grita com Margaret.“ Você matou
meu marido”.
Margaret está
atônica ao que está acontecendo e ora “ Senhor Deus, Pai de todos nós, caso
nunca tenha ouvido minhas orações, ouça agora... Salva o Pedro, Senhor,
salva-o”. Mas Pedro piora e começa a vomitar [...] No entando, Margaret,
continua orando em silêncio “ Ah, Senhor, o que será de Rosa?...O que vai
acontecer na tua obra? Tu começaste isso tudo, Senhor. Não fui eu. Tu me
guiaste até aqui. Respondeste minhas orações e trouxeste o Pedro para me
ajudar; ele é o único... Senhor, não te esqueças. Não há mais ninguém”.
Mas Pedro
morre, e isso significa o fim do trabalho da Margaret [...] parecia, naquela
noite em que Pedro morreu, que alguém escrevera fim em tudo que eu havia
realizado.
Chegando ao
final do livro, encontramos uma jovem missionária profundamente confusa. Não aconteceu
nenhuma mudança de última hora. Ao lado do tumulo de Pedro, Margaret pergunta:
“ E Deus? Onde Ele está nesta hora? “Estarei contigo”, ele garantiu. Comigo
nisso? Ele deixou Pedro morrer[...] E será que agora, me perguntei ao lado da
sepultura, ela quer que eu o glorifique?
A resposta foi
sim, [...] descobrimos mais tarde em umas das palestras da Elisabeth Elliot,
ela mencionou a última página do livro, na qual se encontra, segundo ela
disse, o parágrafo chave :
“Se Deus fosse apenas meu
parceiro, ele teria me traído. Como, no entando, ele é Deus, ele me
libertou!”
Elizabeth
explicou que a imagem de escultura, era um Deus que sempre agia conforme nosso
querer. Era um Deus que apoiava nossos planos, segundo o que nós achávamos
melhor para o mundo e a história. Nesse modo de agir, Deus é nosso parceiro,
alguém com quem nos relacionamos, desde que ela faça o que queremos. Se ele
quiser agir de outra maneira nosso desejo é despedi-lo ou hostiliza-lo, como faríamos
com um conhecido incompetente.
Contudo, no fim
do livro, Margaret percebe que servia ao “deus dos meus planos”, ela vivia
extremamente ansiosa. Nunca tinha certeza se Deus iria socorre-la e ajeitar as
coisas. Vivia tentando descobrir como força-lo a realizar o que ela havia
planejado. A verdade, porém, é que nunca o havia tratado como Deus, como o
todo- sábio, todo-poderoso, todo-bondoso!!
Agora
ela se sentia livre para depositar sua esperança não em seus planos e
prioridades, mas em Deus, e somente nele. [...] E, ao agir assim, ela ficou
livre do esforço desesperado, condenado ao fracasso e exaustivo de controlar
todas as circunstancias de sua vida e da vida de seus amados. [...]
O tema
recorrente da obra de Elliot é que, confiar em Deus quando não o
entendemos significa trata-lo como Deus, e não como um outro ser humano. E
trata-lo como glorioso, infinitamente superior a nós em bondade e sabedoria.
Mas, como Jesus diz, a glória de Deus nunca foi revelada de maneira mais
esplendorosa do que na cruz ( Jo12.23,32). Ali vemos que Deus é tão infinito e
integralmente justo que Cristo precisou morrer pelo pecado, mas também que Deus
é tão amoroso que Jesus se mostrou disposto e feliz ao morrer. Portanto,
confiar na sabedoria de Deus durante o sofrimento, mesmo quando ficamos sem
entender nada, é lembrar da glória e significado da cruz. Elliot raciocina
desta forma:
”As mãos que
impedem milhões de planetas de caírem
no caos, ficaram inertes, pregadas numa cruz por nós[...]” Podemos confiar
nele?
Vemos, então,
que um dos propósitos do sofrimento é glorificar a Deus tratando-o como Deus,
infinito, soberano, totalmente sábio e, mesmo assim, encarnado e sofredor. E
agindo assim, encontraremos descanso para nossas almas, que não está firmado em
circunstâncias.
Timothy Keller
Extraído do livro: "Caminhando com Deus em meio a dor e ao Sofrimento" São Paulo:
Vida Nova. p. 189-193
Publicado com permissão.
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