NelsonGalvao,
As igrejas evangélicas no Brasil creem que a Bíblia é a Palavra de Deus? por pr. Nelson Galvão
Tempos atrás visitei a igreja de um pastor
conhecido. O professor de jovens havia faltado. Assim, o pastor pediu para que
eu desse aquela aula. Uma vez na sala com os jovens, perguntei qual era a
lição. Eles prontamente me deram a revista e me indicaram o capítulo. Foleando
a lição percebi que apontava para um texto bíblico que eu havia estudado
recentemente. Assim, lancei a proposta:
- O que vocês acham de deixarmos a revista de
lado um pouco e estudarmos diretamente o texto bíblico?
Achei que a proposta seria empolgante, afinal a
maioria era de universitários e deveriam estar acostumados a valorizar as
fontes primárias. Mas a resposta me surpreendeu:
- Pastor, é melhor seguir a lição!!!
Outro dia, depois de uma pregação um jovem me
procurou para conversar. Ele estava muito abatido e desorientado. Ele disse que
pertencia a uma igreja pentecostal e a “profeta” da igreja o havia orientado da
seguinte forma:
- Filho, você anda estudando demais a Bíblia.
Estudar a Bíblia é bom, mas você pode ficar “frio” com isso. Você precisa dar
mais liberdade ao Espírito!
Conversando com um pastor de jovens, este
compartilhou que estava enfrentando muita dificuldade em sua igreja, pois um
grupo de jovens se reuniu e disse a ele:
- Pastor, temos que diminuir os estudos
bíblicos. Os jovens precisam é de mais confraternizações, espaço para diversão
e bate-papo.
Quando cheguei na cidade onde moro, ao visitar
a EBD de uma igreja histórica, me deparei com a afirmação de um dos pastores
que ensinava em classe única para todos:
- Irmãos, a Bíblia não é a Palavra de Deus, mas
se torna a Palavra de Deus a medida que temos experiência com ela.
Diante
dessas quatro breves histórias, pergunto: As igrejas evangélicas no Brasil crêem
que a Bíblia é a Palavra de Deus?
É muito curioso que no ano em que celebramos os
500 anos da Reforma Protestante, o que caracteriza a maior parte das igrejas
evangélicas no Brasil é a rejeição à Palavra de Deus (se não direta, com
certeza na prática).
A primeira história remonta a muitos
evangélicos que têm mais apego aos seus costumes, declarações e confissões, do
que às Escrituras. Para esses, o que importa não é a verdade, mas o que sua
denominação lhes impõe. Se a Bíblia condena claramente o pastorado feminino,
mas o comentarista da revista da EBD aponta favoravelmente, ou a Convenção de
tal Estado aprova, então ficasse com estes, porque isso é mais conveniente para
o contexto sociocultural de nossa época! Assim, embora se afirme que a Bíblia é
a Palavra de Deus, na prática, esta é rejeitada.
A segunda história remete aqueles que rejeitam
as Escrituras (não diretamente, mas na prática) em nome de pretensas experiências
místicas. Nesses meios, a Bíblia é tida com desconfiança, especialmente onde se
contrapõe a revelações, sensações, sonhos e visões. Por exemplo, a Bíblia é
clara quando proíbe o casamento com um descrente (1 Co 7.39). Mas a irmã
profeta “fulana de tal” me deu uma profecia dizendo que me case com aquele
rapaz que conheci e estou apaixonada, embora não seja crente no Senhor. Então, o
que faço? Seguirei a “profeta”, embora eu afirme que a Bíblia é a Palavra de
Deus. O que acontece é que, na prática, estou negando as Escrituras.
A terceira história aponta para os evangélicos
emergentes que entendem que apego às Escrituras é coisa do “arcaísmo dos tempos
apostólicos”. O que é moderno é a regra. Isso significa “louvorzão”, ao invés
de estudo da Palavra, “encontro” ao invés de culto, “bate-papo” ao invés de
pregação, “descontração” ao invés de serviço, “terapia em grupo” ao invés de
confrontação bíblica.
A quarta história remonta a uma corrente
teológica muito popular entre as igrejas históricas no Brasil, o neoliberalismo.
Esta corrente foi importada dos EUA e popularizada pelos Seminários Teológicos ao
longo do séc. XX. Segundo esta corrente teológica, as doutrinas centrais do
cristianismo são reafirmadas, mas a totalidade da inspiração e inerrância das
Escrituras são negadas. Assim é comum ouvir em igrejas afetadas por essa
teologia: “Paulo era machista”, ou “esse texto não é para a nossa época”. Os
textos bíblicos, quando lidos, são interpretados de maneira subjetiva e o que
mais se ouve são coisas do tipo: “assim como Deus libertou Daniel da cova dos
leões, Ele vai te libertar da cova do problema em que você se encontra”! Dessa
forma, na prática, a Bíblia é rejeitada como Palavra de Deus.
Essas correntes da igreja brasileira (não fui
exaustivo, poderia citar várias outras), remontam a negação na prática das
Escrituras como inspirada, inerrante, autoritativa, suficiente Palavra de Deus.
Uma marca triste que faz a igreja brasileira ser tudo, menos evangélica.
O resultado disso, dentre outras coisas, é o número
cada vez maior de pessoas que não têm convicção de sua fé, e isso porque não
conhecem o que crêem. Essas vivem a vida sendo levadas pelo pensamento de
outros. Essas pessoas, apesar de se
considerar cristãs, se deixam levar por inúmeras influências (2 Tm 3.6). É por
isso que uma jovem que se divorciou depois de 5 anos de casada justificou-se da
seguinte forma: “Eu mereço ser feliz”. Ela não sabe, mas esse é o discurso da
filosofia Hedonista, muito presente em nossa época.
Isso me faz lembrar do evangelista Marcos. Em
meados de julho de 48[1], de acordo com o relato de
Lucas, “partindo de Pafos, Paulo e os que estavam com ele chegaram a Perge, da
Panfília. Mas João, apartando-se deles, voltou para Jerusalém” (At 13.13). Este
João é o Marcos que escreveu o segundo Evangelho. Marcos apartou-se deles! Por
que? O que aconteceu? Acredito que a falta de convicção de Marcos contribuiu
para que ele abandonasse a viagem missionária quando se deparou com
adversidades.
Assim como Marcos,
muitas pessoas estão na igreja, mas sem convicção. São aqueles jovens que vão
para a Universidade e assim que se deparam com ideologias humanistas, se
afastam da igreja. São aqueles outros que começam a namorar e preferem um
relacionamento promíscuo a comunhão sadia dos irmãos na fé. São aqueles pais de
família que abandonam o lar por conta de uma aventura sexual, ou mulheres que
deixam seu lar por conta de um romance virtual!
Por conta da deserção de Marcos, Paulo chegou a
ter uma grande desavença com Barnabé (At 15.38). Entretanto, tempos depois,
algo mudou em Marcos. Em 65 d.C Marcos escreveu o Evangelho. Dois anos depois (67
d.C), Paulo solicitou Marcos a Timóteo, porque lhe era muito útil (2 Tm 4.11). Segundo
a tradição, Marcos fundou a Igreja de Alexandria e morreu martirizado. Seu
martírio aconteceu no Egito, onde foi “amarrado e arrastado para a fogueira,
foi queimado e depois sepultado num lugar chamado ‘Bucolus’, sob o imperador
Trajano”[2].
O que aconteceu? O que mudou? O que fez com que
Marcos se tornasse um dos maiores evangelistas do cristianismo? O que fez com
que ele ficasse firme em sua fé, até mesmo diante da morte? Com certeza foi a
convicção adquirida. Mas, que convicção foi essa?
Vejamos como começa o
Evangelho de Marcos: “Princípio do Evangelho
de Jesus Cristo, Filho de Deus” (Mc 1.1). Aí está! Depois de todo o seu trabalho
científico de pesquisa e coleta de dados, conduzido pelo Espírito Santo (1 Co
12.3), Marcos apresenta sua conclusão: Jesus é o Filho de Deus. Diante disso,
Marcos não seria mais o mesmo, agora ele estava disposto a enfrentar todo e
qualquer desafio por causa de Cristo.
Agora, de onde veio
essa convicção de Marcos? Como ele a adquiriu? Essa convicção não vem das
Confissões, não vem de experiências místicas como visões ou revelações, nem muito
menos de shows gospel! Essa convicção só pode ser oriunda da observação
cuidadosa das Escrituras. Perceba que na continuidade do texto (Mc 1.2,3),
Marcos cita Ml 3.1 e Is 40.3. Fazendo assim, Marcos menciona o fundamento de
suas conclusões: as Escrituras. São elas que evidenciam que Jesus é o Filho
prometido de Deus.
A fé em Cristo não é
uma fé cega. Está alicerçada em evidências. Marcos descobriu nas Escrituras que
Jesus é o Rei prometido. Foi essa convicção que transformou a sua vida.
Alguém sem a Palavra de
Deus é alguém sem convicção (cf. Rm 10.17). Alguém sem convicção é alguém
levado por todo e qualquer pensamento e circunstâncias. Não é por acaso que as
igrejas evangélicas brasileiras historicamente têm sido levadas por “ondas” de
doutrinas.
Dessa forma, considere
as perguntas abaixo:
a-
Você
conhece a sua fé e tem convicção daquilo que crê?
b-
Você
estuda as Escrituras regularmente procurando saber quem é Deus e o propósito
dEle para a Sua vida?
c-
Na
sua igreja, os encontros da juventude são marcados por festas, shows e muita
descontração e você considera isso normal?
d-
Na
sua igreja, os encontros são marcados pelo estudo de lições de revista de EBD, revistas
de organizações de jovens, mulheres, homens, e você considera isso normal?
e-
Na
sua igreja existe a predominância de estudos fundamentados em conceitos da
psicologia, sociologia e outras disciplinas humanistas, até mesmo com
profissionais dessas áreas, e você considera isso normal?
f-
Na
sua igreja não existem pequenos grupos de estudo da Palavra de Deus,
diretamente do Texto Sagrado, e você considera isso normal?
Responda sinceramente a
essas perguntas. Elas ajudarão você a refletir se, embora afirme que as
Escrituras são a Palavra de Deus, na prática, tem a rejeitado. Se for o caso,
quero incentivá-lo a:
·
voltar-se
às Escrituras em seus estudos pessoais, e deixar de fazer parte da tendência da
maioria das igrejas evangélicas do Brasil.
·
procurar
uma igreja evangélica realmente bíblica (ainda que você tenha que fazer uma “viagem”
todo domingo), que zele pelas Escrituras, não somente no discurso, mas também
na prática.
Pr. Nelson Galvão
Sola Scriptura
[1] Carlos Oswaldo Pinto. Foco e Desenvolvimento no Novo Testamento. p. 184
Nelson é casado com Simone desde 1997 e eles têm um filho. Ele é formado em História e Teologia, pós-graduado em Administração Escolar e mestre em Educação (PUC-SP). Atualmente faz mestrado em Teologia do Novo Testamento no Seminário Bíblico Palavra da Vida- Atibaia, SP.
É pastor interino da Igreja Batista Sião (São José dos Campos-SP) e atua como diretor acadêmico do ministério Pregue a Palavra.
Atua ainda como coordenador do grupo do Pregue a Palavra de Cuba e como professor convidado da Escola de Pastores PIBA.
Belo texto! Foi muito feliz em seus comentários Mestre Galvão!
ResponderExcluirPastor Nelson, eu louvo a Deus pela sua vida. Agradeço a Ele por ter lhe conhecido, pois, tenho crescido muito com as suas publicações. Precisamos de mais homens de Deus como você messes dias de tanta incredulidade e desprezo pela palavra de De Deus. A igreja brasileira precisa urgentemente voltar as Escrituras. Lhe admiro muito e não tenho dúvidas que você é uma voz de Deus clamando por chuva para encharcar o deserto árido que há no coração de boa parte dos pregadores brasileiros. Que o SENHOR te abençoe e te guarde, que o SENHOR levante o seu resto sobre ti e tenha misericórdia de ti. "Que o SENHOR sobre ti levante o seu rosto e te dê a PAZ."
ResponderExcluirPrecisamos de mais homens de Deus no mundo antes que Jesus volte.
Amém
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