NelsonGalvao,
Série: TEOLOGIA E FAMÍLIA. Parte final - A culpa é de Cabral? por pr. Nelson Galvão
Segundo os pregadores da “maldição
hereditária”, quando se constata alguma maldição na vida de alguém, de alguma
coisa ou lugar, deve-se pesquisar os motivos pelos quais a maldição teve
amparo; i, é, a “brecha”.
No caso de coisas, pode-se fazer uma pesquisa
de sua procedência (quase sempre são objetos oriundos de culto afro). No caso
de lugares é necessário fazer uma pesquisa (em muitos casos muito dispendiosas
– para se descobrir as causas da maldição). Por exemplo, o Brasil sofreria a
maldição da miséria porque na colonização os portugueses teriam aberto “brecha”
roubando o tesouro nacional e, os políticos de hoje, ainda causam esta brecha.
No caso de pessoas, faz-se necessário pesquisar
os ancestrais do indivíduo, para ver se alguém, no passado, cometeu algum
pecado e, consequentemente abriu a “brecha”, desencadeando uma maldição. A essa
pesquisa dos ancestrais chama-se árvore
genealógica.
Vejamos
o que diz Robson Rodovalho, em seu livro “Quebrando as maldições”:
“...quando percebemos existir maldições
hereditárias nas pessoas, pedimos para que ela faça um gráfico da árvore
genealógica, até a Quarta ou Quinta geração ou até onde tem informações. E
tentem escrever como foram aqueles antepassados. Como foram suas práticas,
vícios e a história da vida deles. A partir dali, tentamos discernir se existem
maldições que entraram na família, e em oração os quebrar. Temos que até
interceder, pedir perdão por pecados que aqueles antepassados tiveram, e quebrar
os pactos que fizeram.”[1]
Ainda instruindo seus leitores a realizar tal
prática, Robson Rodovalho indica como fazer esta árvore genealógica: (1)
Começar desenhando as raízes que representam a herança familiar; (2) Desenhar o
solo que representa o apoio com que conta a família; (3) Pensar e desenhar o
tipo de árvore que deseja representar; (4) Desenhar um galho representando cada
pessoa da família; (5) Colocar o nome da família na parte superior do desenho;
(6) Comentar sobre o desenho ao cônjuge.
A
Bíblia nos orienta a fazer uma árvore genealógica da nossa família?
O conselho dos mestres da maldição hereditária
para se fazer um histórico familiar, a fim de colher informações sobre alguma
maldição que porventura tenha entrado na família, não encontra respaldo
bíblico.
Uma primeira consideração a ser feita é que a
Bíblia nos ensina que cada um é responsável por aquilo que faz. O profeta
Ezequiel fala sobre isso:
“Veio a mim a palavra
do Senhor, dizendo: Que tendes vós, vós que, acerca da terra de Israel,
proferis este provérbio, dizendo: Os pais comeram uvas verdes, e os dentes dos
filhos é que se embotaram? Tão certo como eu vivo, diz o Senhor Deus, jamais
direis este provérbio em Israel. Eis que todas as almas são minhas; como a alma
do pai, também a alma do filho é minha; a alma que pecar, essa morrerá.” (Ez
18:1-4)
No contexto deste texto, muitos estavam
colocando a culpa de seus fracassos em seus antepassados. Mas, Deus trata com
cada um individualmente.
É claro que com os pecados dos pais, os filhos
podem colher o fruto deste pecado, sendo influenciados a cometerem os mesmos
pecados, e a sofrerem as conseqüências disto (Gl 6:7). No entanto, isto é
quebrado quando a geração se arrepende de seu pecado. A Bíblia nos diz que cada
um dará conta de si mesmo a Deus (Rm 14:12). Não se pode arrepender-se em lugar
de outro.
Uma segunda consideração a ser feita é que
fazer árvores genealógicas assemelha-se muito com a prática da seita mórmon.
Eles fazem isso com o intuito de resolver problemas espirituais de seus mortos,
através do batismo pelos mortos. Isso é antibíblico. A Palavra de Deus condena
tal prática (I Tm 1:4; Tt 3:9).
O texto bíblico mais usado para apoiar a ideia
da árvore genealógica é Ex 20:
“...eu sou o Senhor,
teu Deus, Deus zeloso, que visito a iniquidade dos pais nos filhos até à
terceira e Quarta geração daqueles que me aborrecem e faço misericórdia até mil
gerações daqueles que amam e guardam os meus mandamentos.”
Para
aqueles que costumam procurar textos bíblicos para apoiar seus conceitos, este
é um “prato cheio”. No entanto, precisamos fazer algumas considerações a
respeito deste texto:
(1)
O
contexto é a aliança de Javé com o povo de Israel.
(2)
O
texto trata daqueles que “aborrecem a Deus”
(3)
O
texto trata das consequências do pecado que refletem até outras gerações.
(4)
Deve
ser interpretado à luz de Ez 18.
Á árvore genealógica à luz de 1 Coríntios
A 1 carta de Paulo
aos Coríntios foi escrita no ano 56 d.C, quando o apóstolo estava em Éfeso. A
ocasião da carta foi as notícias de inúmero problemas morais e teológicos que
estavam presentes na igreja. Havia: divisões (1.18 ss); imoralidade sexual (5.1
ss); litígio entre irmãos (6.1 ss); confusão em relação ao casamento (7.1 ss);
arrogância (8.1 ss); confusão em relação ao papel da mulher (11.3 ss); confusão
em relação a ceia do Senhor (11.17 ss); confusão relação aos dons (12-14);
confusão em relação a ressurreição (15). Os pecados dessa igreja eram tantos
que Paulo afirma que tinha que falar a eles, não como a pessoas espirituais, mas como a pessoas
carnais (3.1).
Curioso que, diante
de tudo isso, Paulo não pensou que os crentes de Corinto estavam debaixo de
maldição, como o fazem os mestres de maldição hereditária. Ao contrário, ele os
chamou de santificados (ηγιασμενοις - 1 Co 1.2; 6.11). É
curioso notar que o verbo está no tempo particípio perfeito passivo; ou seja,
os Coríntios já foram declarados santos. Paulo também os chama de santos quando
trata do litígio entre os irmãos (1 Co 6.1), os seus filhos são santificados (1
Co 7.14) e menciona a coleta para os santos.
Na saudação inicial
da carta, Paulo afirma ainda que eles já haviam recebido a graça de Deus por meio de Jesus Cristo (1.4), que eles eram ricos em toda palavra e
conhecimento, e que foram chamados por
Deus para a comunhão de Jesus.
Note, nenhuma
maldição! Por que? Porque os crentes de Corinto já foram abençoados com a
comunhão com Deus que advém do sacrifício de Cristo (1 Co 10.16).
Agora, como Paulo
auxiliou os crentes de Corinto a resolver os problemas que os assolavam? Embora
os crentes de Corinto tivessem muitos problemas morais, Paulo não os orienta a
fazer uma árvore genealógica, a pesquisar os pecados de algum ancestral (muito
menos se arrepender por eles). Também não deveriam fazer jejuns, ou sessões de
quebra de maldição.
Diante dos problemas
da igreja de Corinto, o que Paulo faz é exortá-los. Essa exortação era feita a “irmãos” (1.10; 2.1; 3.1; 4.6; 7.24;
10.1; 11.33; 12.1; 14.20; 15.1; 15.58; 16.15).
Vejamos então as
exortações de Paulo:
a.
No que tange a divisão, o
apóstolo roga que entrassem em acordo e fossem unidos (1.10);
b.
Diante da imoralidade sexual de
um sujeito que tinha relações sexuais com a mulher do próprio pai, Paulo não
diz que a culpa é do avô dele que supostamente deu legalidade ao diabo, mas
exorta à igreja a discipliná-lo (5.5);
c.
Mediante o litígio, Paulo dá uma
bronca nos crentes de Corinto e ordena que eles julgassem as causas entre os
irmãos (6.1);
d.
Para o casamento, Paulo dá
orientações específicas. Ele não ordena a quebra de maldições que supostamente possam
haver no casamento (7);
e.
Sobre orientações em relação à
carne sacrificada a ídolos, de acordo com os mestres de maldição hereditária,
Paulo deveria orientar os crentes de Corinto a se abster da carne porque essa
poderia transmitir espíritos familiares, maldições terríveis. Definitivamente
Paulo não pensava assim. A orientação que Paulo da é que o “ídolo no mundo não
é nada” (1 Co 8.4). Assim, eles deveriam tomar cuidado em não comer a carne,
não por conta de supostas influências maléficas, mas para não escandalizar
alguns que tinham a consciência fraca (1 Co 8.7 ss);
f.
No caso das mulheres, Paulo
esclarece o papel das mulheres no lar e na igreja (11);
g.
Sobre a ceia, Paulo exorta-os a
faze-la dignamente (11.28);
h.
A respeito dos dons, Paulo não
menciona nenhum sequer que seja de identificar espíritos familiares, mas que
aqueles dados pelo Espírito devem ser exercidos com ordem e decência (1 Co
14.40).
i.
Diante dos erros doutrinários
(embora sejam provocados pelos demônios – 1 Tm 4.1), este devem ser combatidos
com o ensino correto das Escrituras. Veja que Paulo afirma que Cristo morreu
pelos nossos pecados e ressuscitou, conforme diz as Escrituras (1 Co 15.3,4).
No fim de todas as exortações e orientações que
Paulo da aos crentes de Corinto, Paulo afirma algo interessante:
“Se alguém não ama o Senhor, seja maldito! Vem,
Senhor” (1 Co 16.22).
A verdadeira maldição
não está sobre os crentes, mas sobre aqueles que permanecem no pecado
rejeitando a obra salvífica de Jesus Cristo. Estes permanecem no estado de rebeldia,
separação em relação ao Criador e, por isso, sob maldição!
Diante de tudo o que foi exposto acima, preciso
fazer algumas considerações finais.
Penso que é mais fácil culpar os outros pelos
próprios erros do que reconhecer o seu próprio. É mais fácil dizer que a responsabilidade
pelo meu pecado é do meu bisavô que era um beberrão do que assumir os meus próprios
erros.
Além disso, repreender demônios, responsabilizando-os pelos
pecados que cometemos, é na verdade uma fuga. Desde o Edem, preferimos responsabilizar a
mulher e a serpente do que arrepender-se e buscar no Senhor a restauração. Mas
não é esse o caminho que nos leva à santidade.
Famílias inteiras têm sido escravizadas e vivido
em inúmeros conflitos porque acreditam cegamente que intempéries da vida
decorrem de alguma maldição, quando deveriam depositar sua confiança no
sacrifício suficiente de Cristo.
A doutrina de maldição hereditária é mais um produto
do sincretismo religioso que é muito comum no Brasil. Precisamos nos voltar à
Palavra de Deus, crendo que tudo o que Ela nos diz é inspirado, verdadeiro,
autoritativo e suficiente. Sola Scriptura!
Pr. Nelson Galvão
Sola Scriptura
[1]
Robson
Rodovalho- Quebrando As Maldições Hereditárias- p. 29
Confira os demais textos da série "Teologia e Família: Maldição hereditária":
Parte 1 - Cuidado com a maldição
Parte 2- Maldição hereditária: cristianismo ou paganismo?
Parte 3- Não consigo deixar o pecado, sou vítima de uma maldição?
Confira os demais textos da série "Teologia e Família: Maldição hereditária":
Parte 1 - Cuidado com a maldição
Parte 2- Maldição hereditária: cristianismo ou paganismo?
Parte 3- Não consigo deixar o pecado, sou vítima de uma maldição?
Nelson é casado com Simone desde 1997 e eles têm um filho. Ele é formado em História e Teologia, pós-graduado em Administração Escolar e mestre em Educação (PUC-SP). Atualmente faz mestrado em Teologia do Novo Testamento no Seminário Bíblico Palavra da Vida- Atibaia, SP.
É pastor interino da Igreja Batista Sião (São José dos Campos-SP) e atua como diretor acadêmico do ministério Pregue a Palavra.
Atua ainda como coordenador do grupo do Pregue a Palavra de Cuba e como professor convidado da Escola de Pastores PIBA.
Muito esclarecedor e edificante. Graças a Deus pela Sua Palavra que ilumina nossos passos.
ResponderExcluirVerdade Julia, louvado seja Deus por Sua Palavra.
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