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A longa jornada da espera. Por Bianca Bonassi Ribeiro
O foco
dessa meditação é encorajar a todos, que de uma forma ou outra sentem-se
forçados a esperar meses ou anos, simplesmente porque esta é a vontade de Deus.
Especialmente àqueles, cuja personalidade tende à uma vida planejada, orientada
para resultados e com muita disposição e iniciativa para agir. Imagino que para
tais pessoas qualquer tipo de espera pode parecer torturante, massacrante e
agonizante. Entretanto, a espera é um dos pilares da nossa fé, ou seja, todo
cristão convertido espera que Jesus, um dia, voltará. Porém, esse tipo de
espera nem ao menos sentimos, simplesmente porque somos apegados a esse mundo
material e terreno. Em contrapartida, quando enviamos centenas de currículos e
não somos chamados para nenhuma entrevista ou aguardamos a chegada de um filho
(seja uma gravidez ou adoção) ou ainda, a realização de um projeto com qual
sonhamos com cada detalhe (casamento, viagem, um novo negócio, compra de um
carro/ moradia, etc.) o ato de esperar se transforma numa longa jornada. O
tempo de espera por algo que esteja dentro da vontade de Deus nos conduz a um
profundo aprendizado espiritual.
A
espera como um ato.
Vale ressaltar que esperar é um verbo, logo, uma ação que
requer um esforço, porque o resultado final, do que se espera, independe de
você. Mas, esperar para um cristão convertido é um esforço para aguardar (dentro
de uma vida limitada pelo tempo) a ação final a ser executada por um Deus
eterno e ilimitado pelo tempo. A Palavra de Deus é uma fonte valiosa de apoio e
encorajamento quando precisamos esperar. “Espere no Senhor. Seja forte!
Coragem! Espere no Senhor” (Sl 27.14).
Aparentemente esperar pode ser
confundido com não fazer nada, entretanto a Bíblia nos ensina que a espera é
uma poderosa ferramenta de santificação e um momento de grande aprendizado para
o cristão. A Palavra de Deus nos dá vários exemplos de pessoas que passaram por
períodos de espera e dois deles serão apresentados aqui para nos encorajar e
ensinar.
Noé
– esperou pouco mais de um ano dentro da arca.
Observe os trechos extraídos do
livro de Gênesis capítulos 7 e 8 que relata o período entre Noé entrar na arca
até o dia de sua saída:
“Então o Senhor
disse a Noé: Entre na arca, você e toda a sua família[...] Noé tinha
seiscentos anos de idade[...] E a chuva caiu sobre a terra quarenta dias e quarenta noites [...] E as águas prevaleceram sobre
a terra cento e cinquenta dias. Então
Deus lembrou-se de Noé[...]e as águas começaram a baixar[...] as águas foram
baixando pouco a pouco sobre a terra. Ao fim de cento e cinquenta dias, as águas tinham diminuído [...] a arca
pousou nas montanhas de Ararate. As águas continuaram a baixar [...] passados quarenta dias Noé abriu a
janela que fizera na arca. Esperando
que a terra já tivesse aparecido, Noé soltou um corvo, mas este ficou dando
voltas. Depois soltou uma pomba para ver se as águas tinham diminuído na
superfície da terra. Mas a pomba não encontrou lugar onde pousar os pés porque
as águas ainda cobriam toda a superfície da terra [...] Noé esperou mais sete dias e soltou novamente a pomba. Ao entardecer, quando a pomba
voltou, trouxe em seu bico uma folha nova de oliveira. Noé então ficou sabendo
que as águas tinham diminuído sobre a terra. Esperou ainda outros sete
dias e de novo soltou a pomba [...] No primeiro dia do primeiro mês do ano
seiscentos e um da vida de Noé, secaram-se as águas na terra. Noé então removeu
o teto da arca e viu que a superfície da terra estava seca. No vigésimo sétimo
dia do segundo mês, a terra estava completamente seca. Então Deus disse a Noé: saia da arca [...] então Noé saiu da arca
[...] Depois Noé construiu um altar dedicado ao Senhor [...] O Senhor sentiu o
aroma agradável.” (grifo meu)
Trata-se
de uma descrição detalhada de acontecimentos enquanto Noé foi obrigado a
esperar e tem o intuito de nos ensinar sobre o que fazer e o que não fazer
durante a espera. Imagine que quando Noé entrou na arca e percebeu a dimensão
da destruição ao seu redor, ele provavelmente sentiu um enorme alívio e o
imenso cuidado de Deus sobre a vida dele, de sua família e daqueles animais que
estavam junto deles. Porém, ele não imaginava o tempo que permaneceria na arca
e isso deve ter sido um grande desafio em sua jornada.
No início do capítulo 7, logo
após Noé ter finalizado a arca e todos os preparativos para sua navegação, Deus
avisa que faria chover sobre a terra por quarenta dias e quarenta noites e um
Dilúvio destruiria tudo, exceto a arca e o que nela estava. Notamos que Deus
não disse a Noé que as águas prevaleceriam por mais de trezentos dias após os
quarenta dias e noites de chuva iniciais. Isso nos mostra que Deus designa o
tempo de espera como um exercício de fidelidade e aprendizado.
Deus deixou muito claro e
evidente quando Noé deveria entrar e quando deveria sair da arca ( Gn 7.1 e
8.15-16), mas nesse meio tempo Deus estava em silêncio observando as atitudes
de Noé. Em contrapartida Noé, que confiava em Deus e em sua soberana
providencia e cuidado, agiu dentro de suas possibilidades para tentar descobrir
quando a espera na arca terminaria. Notamos que a arca parou em Ararate, mas Noé
esperou quarenta dias para abrir a
janela e observar, ele foi cuidadoso e primeiro soltou um corvo e depois uma
pomba. Somente, após sete dias Noé soltou a pomba mais uma vez e ela voltou com
uma folha nova no bico, um sinal de que as águas estavam baixando. Importante
ressaltar que ele usou as técnicas e instrumentos disponíveis e que estavam ao
seu alcance durante o período em que aguardava sua saída da arca.
Noé esperou mais sete dias e pela
terceira vez soltou a pomba, que não voltou, o que indicava que ela havia
encontrado lugar para abrigar-se. Depois de mais um tempo, Noé removeu o teto
da arca e viu que a terra estava seca e aguardou o comando de Deus para sair.
Vale ressaltar que durante todo esse período Noé tinha muitas responsabilidades
dentro da arca e de forma alguma, a vontade de sair e o cansaço da espera o fez
menosprezar suas responsabilidades no cuidado e manutenção não só de sua
família, mas de uma quantidade enorme de animais diversos que Deus havia
preservado do Dilúvio e que estavam junto dele na arca.
A jornada de espera de Noé, nos
ensina que enquanto esperamos podemos tentar descobrir quando o resultado final
de nossa espera virá acontecer, mas sempre debaixo da orientação de Deus. Noé,
mesmo quando viu que a terra estava seca não agiu sem antes ter a certeza de
que havia chegado o tempo de sair, porque ele sabia que o mesmo Deus que o
havia colocado naquela situação seria o Deus que o haveria de tirar daquele
contexto. O fruto dessa jornada difícil culmina num relacionamento de
intimidade entre Noé e Deus. No final do capítulo 8 há um relato de que Noé
construiu um altar dedicado a Deus, um símbolo de adoração individual. Deus o abençoa
e também estende a benção aos filhos dele e a todos os animais que com eles
estavam.
A jornada de espera pela qual Noé
passou, o levou a depender mais de Deus na certeza de que ele fez o que deveria
ser feito e estava debaixo da proteção e boa mão de seu Deus.
Josué
– o protagonista da espera.
A vida de Josué foi marcada por
períodos intercalados de lutas e esperas. Ele nasceu no Egito, como escravo e
foi libertado por Deus junto com o povo de Israel, por intermédio de Moisés.
Desde jovem foi escolhido como auxiliar de Moisés (Nm 11.28) e no início de seu
trabalho como auxiliar do grande profeta, enfrentou um período de quarenta dias
e quarenta noites de espera. Observe os trechos que resumem esse período:
“Disse o Senhor a Moisés: Suba o
monte, venha até mim, e fique aqui; e lhe darei as tábuas de pedra com a lei
[...] Moisés partiu com Josué, seu
auxiliar, e subiu ao monte de Deus (Ex 24. 12-13)[...] Então o Senhor disse a
Moisés: Desça, porque o seu povo, que você tirou do Egito, corrompeu-se [...]
Então Moisés desceu do monte [...] Quando Josué ouviu o barulho do povo
gritando, disse a Moisés: Há barulho de guerra no acampamento (Ex 32. 7, 15 e
17). Passados os quarenta dias e
quarenta noites, o Senhor me [Moisés] deu as duas tábuas de pedra, as
tábuas da aliança, e me disse: Desça imediatamente (Dt 9.11-12a – grifo meu)”.
Em geral, esse trecho é sempre
estudado pela perspectiva de Moisés, mas nesse momento, voltemos nossa atenção
para Josué. Note que ele esperou ao pé do monte e assim, permaneceu longe tanto
de Moisés que havia subido o monte quanto do acampamento onde o povo de Israel,
Arão, irmão de Moisés e os demais líderes do povo, estavam acampados. Embora a
Bíblia não revele os detalhes desse tempo de espera, nós podemos imaginar o
cenário e lições de vida.
Imagine que Josué, ainda jovem,
estava no deserto e sem nenhum aviso de quanto tempo deveria esperar. Creio que
somente um servo fiel suportaria essa incógnita com relação ao tempo, confiando
na esperança de que um dia o mesmo que o fez esperar seria o mesmo que o faria
voltar ao acampamento. Afinal, eles haviam sido libertos da escravidão, no
Egito, para conquistarem a terra prometida. Josué conseguiu esperar porque
confiava no Deus que o havia livrado de forma espetacular e com sinais
miraculosos. Creio também, que ele não poderia conceber a ideia de que pela lógica
dos acontecimentos passados ele terminaria sua vida, ainda jovem, morto de
tanto esperar aos pés de um monte no deserto.
Ainda mais, esses quarenta dias e
noites de espera ao pé do monte, de certa forma se tornou um mecanismo de
livramento e ao mesmo tempo um exercício de paciência e perseverança para
Josué. Primeiro, porque durante esse período, no acampamento, o povo
desmotivado pela espera e demora em relação ao retorno de Moisés, se corrompeu
e passou adorar outros deuses. Segundo, para Josué, esse período foi uma prévia
da longa jornada de espera pela terra prometida, que no total foram quarenta
anos no deserto até que ele pode desfrutar da terra prometida por Deus, ao povo
de Israel. As quatro décadas de espera começou com a missão de reconhecimento
da terra:
“E o Senhor disse a Moisés: envie
alguns homens em missão de reconhecimento à terra de Canaã, terra que dou aos
israelitas. [...] Assim Moisés os enviou do deserto de Parã [...] da tribo de
Efraim, Oseias,[...] A Oseias, filho de Num, Moisés deu o nome de Josué [...]
ao fim de quarenta dias eles voltaram da missão de reconhecimento daquela terra
[...] De todos os que foram observar a terra, somente Josué, filho de Num, e
Calebe, filho de Jefoné, sobreviveram [...] durante quarenta anos vocês sofrerão [...] cada ano corresponderá a
cada um dos quarenta dias em que vocês observaram a terra”(trecho extraído de
Nm 13.1-25; 14.30 e 34 – grifo meu).
A espera e sofrimento no deserto,
durante quarenta anos, não foi pelo pecado e rebeldia de Josué, aliás foi
justamente o contrário, ele sofreu por consequência do pecado de outros (povo
de Israel) que pecaram por não confiar em Deus e ter medo de lutar e conquistar
a terra prometida. As quatro décadas de espera serviram como memorial e
testemunho da bondade e fidelidade de Deus a todo aquele cuja confiança está no
Senhor. Em meio as lutas desse período o relacionamento entre Josué e Deus cresceu
e culminou numa das declarações mais encorajadoras de toda a Bíblia e é com ela
que gostaria de encerrar e encorajá-lo a permanecer fiel, a Deus, durante a sua
longa jornada de espera:
“Depois da morte de Moisés, servo
do Senhor, disse o Senhor a Josué, filho de Num, auxiliar de Moisés: [...]
Ninguém conseguirá resistir a você todos os dias da sua vida. Assim como estive com Moisés, estarei com você; nunca o deixarei, nunca o
abandonarei. Seja forte e corajoso, porque você conduzirá este povo para
herdar a terra que prometi sob juramento aos seus antepassados. Somente seja forte e muito corajoso! Tenha
o cuidado de obedecer a toda lei que o meu servo Moisés ordenou a você; não se desvie dela, nem para a direita
nem para a esquerda, para que você seja
bem-sucedido por onde quer que andar. Não deixe de falar as palavras deste
Livro da Lei e de meditar nelas de dia e de noite, para que você cumpra
fielmente tudo o que nele está escrito. Só então os seus caminhos
prosperarão e você será bem-sucedido. Não fui eu que ordenei a você? Seja forte e corajoso! Não se apavore nem
desanime, pois o Senhor, o seu Deus, estará com você por onde você andar
(trecho extraído de Js 1. 1-9 – grifo meu)”.
Que a nossa espera culmine num
testemunho que glorifique a Deus!
Bianca Bonassi Ribeiro
Bianca é casada com Luciano. Eles têm dois filhos, o Pedro e o Vitor. Ela faz parte da equipe docente da Universidade Presbiteriana Mackenzie-SP, desde 2007 e é membro da Primeira Igreja Batista de Atibaia.
Bianca é doutora em Comunicação e Semiótica, mestre em Administração e graduada em Administração de Empresas.
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